domingo, 8 de março de 2009

Entrevista para a revista Visão Estilo+Design

Catarina

Pensar que as delicadas jóias em prata de Catarina Silva nascem numa bancada, com instrumentos tão brutos como maçaricos de fundição, motores de bicha, alicates e serras parece não fazer sentido. Mas é aqui, num ateliê em Campo de Ourique, que esta lisboeta, de 26 anos, cria alfinetes, colares, anéis e outras peças de joalharia. Nos últimos dias, tem passado horas a fio a soldar, uma a uma, argolinha a argolinha, para fazer um alfinete de filigrana. São estes trabalhos, aliás, que mais prazer lhe dão. "Demora meses a fazer, mas sinto-me mais ligada à peça, dou mais de mim, tanto em tempo como em alma".
Há oito anos que Catarina passa os dias entre jóias. Quando abandonou o ensino secundário e decidiu inscrever-se no Ar.Co - Centro de Artes & Comunicação Visual nem imaginava que a escolha seria tão certeira. "Apaixonei-me logo", afirma, recordando as "maratonas de joalharia" que fazia com os colegas, noite dentro, até a escola fechar, ou, aos feriados, quando pediam a chave para poderem entrar. Desde a primeira peça que fez - "serrei um cogumelo" - e da primeira jóia - "um colar horrível que, na altura, achava fantástico, com uma estrutura de metal forrada a lã cor-de-rosa e branca com brilhantes e uma coisa para enfiar a mão e dar festinhas" - defeniu o material que prefere trabalhar. "Gosto de experimentar vários, mas regresso sempre ao metal. Relaxa-me trabalhá-lo. Se tivesse mais dinheiro, usava o ouro, assim,uso a prata, diz, a rir.
A inspiração pode vir-lhe de todo o lado. Desde os workshops, que frequenta, aos livros que devora ou às exposições que vai ver - como a das Máscaras da Ásia, patente no Museu do Oriente e que a deixou cheia de ideias. Seja qual for a fonte, Catarina reconhece que as suas jóias têm uma linguagem comum, que foi buscar à joalharia tradicional portuguesa e à indiana. Basta ver um dos seus alfinetes de cobre banhado a ouro e pintado de vermelho ou o seu pin de prata pintada da mesma cor para reconhecer estas influências. "Até são duas joalharias bem semelhantes", defende.
Outra característica das suas jóias é a leveza. "Não gosto de trabalhos pesados, com demasiada informação." E se se encontra a meio de uma peça que não está a ficar como tinha imaginado, garante que nem a acaba. "Como o metal tem esssa coisa boa de se poder derreter, não há problema", nota, divertida. É também por isso que prefere atirar-se para a bancada e fazer uma maqueta em vez de desenhar antes no papel.
As suas jóias mais emblemáticas são provavelmente as que criou no projecto individual de final de curso, em que trabalhou sobre o seu percurso de vida. Criou peças inspiradas nos ponteiros de relógios, como símbolo do tempo, e em rosas-dos-ventos, como metáfora do espaço. Algumas delas estão à venda numa galeria alemã, onde expôs o seu trabalho há uns anos. Já em Lisboa, podem encontrar-se peças suas na Galeria Tereza Seabra, na Galeria Reverso e , por vezes, no Atelier Nininha Guimarães.
A arte de fazer jóias ganhou-a no Ar.Co, mas foi na Reverso, onde esteve dois anos, que aprendeu a trabalhar "rápido e bem" e a "falar com as pessoas, para perceber o que gostam" - duas características fundamentais de uma boa joalheira, considera.
Mas nem tudo brilha como o ouro e a prata nesta história. Catarina sabe que, apesar de, em Portugal, as pessoas estarem mais atentas à joalharia de autor, se continua a dar mais valor às jóias tradicionais das ourivesarias - ou então, por uma questão de dinheiro, ainda se investe muito em bijuteria. Por isso, as contas do fim do mês são pagas sobretudo com aulas de joalharia, que dá a quem queira fazer disso um hobby ou com visitas guiadas que faz no Palácio Marquês de Fronteira. Mas, na verdade, estas não chegam a ser razões de queixa para quem tem apenas 26 anos.

In Visão Estilo+Design Outono/Inverno 2008, por Alexandra Correia e Gabriela Lourenço, fotografia de António Nascimento.